23 de ago. de 2014

Postado por AnaBaú às sábado, agosto 23, 2014 0 comentários
Vejo que o tempo passou mas não consigo dizer com que velocidade. Há manhãs em que acordo e sinto como se estivesse congelada na história, vivendo de manhãs eternamente iguais. Há outros dias porém que é como se houvesse alguém novo em mim, cheio de vida e com os bolsos carregados de esperanças. Há dias em que só quero viver, experimentar na boca o gosto da palavra intensamente. Há dias que sequer me mexo na cama para não ter que sentir que ainda tenho uma pele.
Desde que comecei a escrever aqui muitas histórias nasceram e muitas histórias nasceram, isso me faz pensar que escrever é eternizar o movimento da vida. Como se cada palavra guardasse um sonho, um som que forma a mais bela das melodias, mas não há quem a toque.
Aqui estão os mesmos dedos de outrora, em outro teclado, em outro sonho, no mesmo corpo. Estariam as paredes ainda cheias de mofo? Ou esse cheiro que sinto é apenas a lembrança de que um dia tudo esteve pior?
E esse coração que ainda bate é o mesmo que bateu tão intensamente outrora? Esperava que tu pudesses responder essa questão para mim. Querido diário, tu és quem acompanha minhas angústias, minhas alegrias, medos, frustrações, agonias. Meus voos de libertação, minha carta de amor, minha condenação à prisão.
Olho-te demoradamente, percorro tuas páginas, leio teus títulos, tentando entender quem eu fui um dia para quem sabe entender quem é que está aqui, agora, escrevendo esse texto.
Bem, já não sei se fui um dia aquilo que verdadeiramente sou, mas seguirei tentando, e as tuas páginas serão a prova de que tudo foi real. Um dia.

16 de ago. de 2014

Sobre a brevidade da vida.

Postado por AnaBaú às sábado, agosto 16, 2014 0 comentários
Ela estava sentada em uma pequena mesa perto da janela, à sua frente estavam papel, caneta e uma pequena rua movimentada. Suspirou. Olhos entreabertos, faltavam-lhe forças para mantê-los altivos, as únicas forças que lhe restavam seriam usadas para escrever um bilhete endereçado à ninguém.
Suspirou outra vez. Não sabia por onde começar, talvez devesse iniciar pelo motivo que a estava impelindo a escrever a carta. Começou assim, “Talvez hoje seja uma das noites mais frias do ano, na rua à minha frente algumas pessoas andam demoradamente, enquanto outras andam rapidamente para fugir do frio. Eu seria uma das pessoas que andam demoradamente, iria apreciar cada fagulha de frio atravessando meu ser, congelando meus ossos e o meu coração. Deitaria no chão e deixaria lentamente que o meu calor se esvaísse, tornando-me apenas um corpo congelado no chão.
Querido papel, você é tudo o que me restou. Eu deveria estar rindo dessa situação, afinal você ainda é alguém, mas não estou. Fazem dias que meus únicos companheiros são as pessoas que passam por essa rua, e eu estive pensando sobre a minha curta vida. Não tenho mais que vinte e poucos anos e já estou demasiadamente cansada para continuar. Você pode pensar, mas você ainda tem olhos para ver, e força para segurar uma caneta, não há do que reclamar. A questão é que eu não tenho nada a perder. As pessoas viviam antes de eu aparecer, continuaram vivendo enquanto estive aqui e continuarão vivendo quando eu não mais estiver aqui. Quem sabe encontrem-no sobre a mesa quando vierem cortar a luz e água que não foram pagas, ou quem sabe interditarem a casa. Bom, pode ser que ninguém o encontre, mas isso não faz diferença, a questão é que você é o único que vai conhecer os meus reais motivos.
Eu sou como você, pálida e solitária, sem uma história para contar. E ninguém tem força suficiente para escrever histórias em mim, nem eu mesma. Mas o segredo que quero lhe contar não é esse, o segredo é que depois que você viveu tudo o que quis não há razões para continuar. Eu já não tenho mais nada a perder, a não ser entregar-me para a brevidade da vida, uma vida que bebi até a última gota, mas que já não me satisfaz”.
Garis encontraram a carta caída numa pequena rua movimentada. Nunca saberão o que houve antes ou depois, nunca saberão quem era a moça. Quem sabe nunca tenham a encontrado, porque ela nunca esteve perdida. Sem nome ou data, ninguém.

Meninos copiadores

Postado por AnaBaú às sábado, agosto 16, 2014 0 comentários
Sinto-me como uma ave presa no meio de outras milhões de aves, um menino-copiador que passa seus dias reproduzindo as obras centenárias. Mas se um dia a janela estivesse aberta, o vento poderia soprar tão forte que faria a tinta cair sobre o papel produzindo algo mais do que letras. Talvez nesse dia, o menino-copiador se desse conta de que ele também poderia se tornar um menino-criador. O papel então poderia se tornar o que ele quisesse, poderia mostrar o mundo dele e instigar os outros meninos-copiadores a serem meninos-criadores, poderiam então juntos produzirem desenhos, pinturas, escritos próprios, e o vento se encarregaria de enviar suas criações aos outros lugares do mundo, muitos outros meninos-copiadores que estivessem copiando, largariam suas canetas e poderiam criar também. Afinal, de que vale uma escrita maravilhosa, se ela morre na gaveta, no arquivo, no incêndio? Mas o vento não soprou naquela tarde, a janela não se abriu e a tinta continuou no mesmo lugar. O único movimento perceptível na sala, eram o mergulhar das canetas nos tinteiros, e a mão que fazia o delineamento no papel, mas ao fundo da sala o supervisor mantinha-se atento à qualquer movimento contrário do imposto. O que ninguém sabia é que um dia ele havia sido um menino-copiador também e que o maior desejo dele era que um dia a janela se abrisse e a tinta pudesse criar.

Sobre um amor que precisa ir.

Postado por AnaBaú às sábado, agosto 16, 2014 0 comentários
Eu estava com um post pronto, quando algo me disse que o nosso amor precisa ir. Eu sei que não há nada melhor a fazer do que escrever sobre nós para que possamos então ficarmos livres. Coincidência ou não, ao fundo Christina Aguilera canta “You lost me”, mas amor eu acho que nós não nos perdemos, ou apenas não quero acreditar nisso.
Peço que não chore, as despedidas não precisam serem tristes para serem verdadeiras. E por favor não queira me beijar, os seus lábios nunca foram meus… Eu ainda lembro do dia em que nos encontramos pela primeira vez. O seu sorriso de semideus não me deixou desviar a atenção, seus olhos eram esmeraldas que me cativavam ainda mais que o sorriso, e então começamos conversar sobre algo que não consigo lembrar e logo tivemos a sensação de estarmos conversando por toda uma vida.
Aos poucos fomos vendo o quanto nos parecíamos, a nossa infância cheia de fatos iguais, as mesmas dúvidas na adolescência, os mesmos medos, as mesmas teimosias, os mesmos erros… As vezes chegava a ser assustador ter alguém tão semelhante a mim em outro corpo. E assim fomos nos curando, você sempre me aceitando como eu era, e eu sempre te aceitando como você era, ambos tirando sarro da cara do outro pelos mesmos comportamentos.
Eu pude mostrar o pior de mim e esperei que você fosse embora, mas de repente parei e ri, o pior de mim era também o pior de você. Como isso poderia ser possível? Dez anos nos separavam e um instante nos unia.
- Ana, você ainda é uma adolescente.
Eu rio novamente, porque havia esquecido disso. E de repente olho pro espelho e vejo que nesses cinco meses que nos conhecemos, rejuvenesci cinquenta anos, me sinto leve e parece que posso alçar voo a qualquer instante. Estou mais forte, mais dentro de mim, mais confiante na pessoa que eu sou, porque você apareceu e me curou.
Mas amor, eu sinto que o nosso tempo está acabando. As minhas histórias de amor sempre acabam com alguém indo embora, e acho que já começamos a retomar nosso caminho. Eu já não sinto seu coração batendo dentro de mim, nem o calor das suas mãos, nem aquele brilho nos olhos que me hipnotizaram. Menino, eu não quero ser novamente a garota com o coração quebrado, e não quero que você seja mais um amor que veio e depois foi embora. Então proponho que dancemos essa música que toca ao fundo, sentindo nossos corpos colados, as nossas respirações ritmadas, sem nenhuma palavra. Vamos nos movendo lentamente para que esse momento seja eternizado e depois cada um pode voltar para a sua vida.
Amor, hoje eu preciso que você vá. Porque eu sei, eu sinto aqui dentro que enquanto você estiver aqui, eu não poderei encontrar um amor que venha e que possa ficar. Amor, você sabe que eu ainda sou apenas uma menina querendo ardentemente viver um amor. Nós vivemos algo mágico, mas você nunca pôde segurar minha mão.
Postado por AnaBaú às sábado, agosto 16, 2014 0 comentários
Lá estava eu, sentada ao lado da janela, admirando a paisagem e bebericando um café quente.
Resolvi escrever apenas deixando que a caneta deslizasse pelo papel, sem emoções explodindo junto com a tinta marcada. Escrever olhando para aquilo que não está contido nas palavras. O segredo, o mistério, o não-dito. Escrevo porque não posso falar, assim como o verbo, a música que não pode ser tocada para não perder o sentido.
Destino, deixar que a vida te guie. Pegar a mão do Universo e dizer que eu acredito que você irá me levar para onde preciso ir, e acredito que posso chegar nesse lugar sem ser passiva no processo. Eu escolho, acredito e caminho, não espero ser carregada.
Quero sentir a poeira nos meus pés, o cansaço, cair na cama e sentir que o dia valeu a pena, o descanso, o alento , o vir-à-ser que nunca acabe mesmo que fim chegue. É bom saber que no fim, existe lucidez no que escrevo.
Olho para a xícara, e tomo um gole de café frio, o tempo passou e eu descobri que não sentir intensamente, não indica que o caminho foi vazio, pelo contrário, agora sim eu sinto verdadeiramente cada átomo do meu ser.

Tornar-se pessoa.

Postado por AnaBaú às sábado, agosto 16, 2014 0 comentários
Nascemos e logo nos dão um nome, uma certidão de nascimento, um horário, um número de apgar e, a partir daquele momento, somos cidadãos brasileiros. Passamos a ter direitos, deveres e somos reconhecidos, mas isso é suficiente para que nos tornemos pessoas?
 No início, somos um caos, um folha em branco que vai sendo pintada pelos nossos pais, pelas experiências que vamos vivendo, pelos diversos sentimentos que passam por nós sem que consigamos identificá-los sozinhos. Aos poucos, nossos pais nos ensinam que podemos confiar neles (ou não), que temos que os respeitar porque eles sacrificaram a vida deles por nós, que temos tudo o que temos graças a eles. Aprendemos a compartilhar nossas coisas (ou não) com nossos irmãos, amigos, primos, colegas, ou então temos tudo para nós mesmos.
Vamos para a escola e passamos, ano após ano, com medo de chegar em casa com a notícia da reprovação e levar uma surra de cinto. Fazemos amigos e começamos a construir novas formas de se relacionar e ser, diferentes daquelas que tínhamos em casa. Até que chega o momento em que nos perguntamos quem nós somos, ou quem fomos até aquele momento. Eu me fiz essa pergunta durante muitos anos e penso que realmente me tornei uma pessoa no momento em que passei a fazer minhas próprias escolhas. Tornar-se pessoa é escolher, e escolher é tornar-se pessoa. É poder escolher ser quem se é, independentemente do que as outras pessoas pensarão sobre isso. É construir-se positivamente na relação com os outros, é definir afastamentos e aproximações, é escolher ficar, mas também escolher ir embora.
 É ter coragem de largar tudo o que teve até então e ir embora na tentativa de se encontrar. De passar todos os dias da sua vida sendo cada vez mais quem você é. E isso não significa passar uma vida sozinho, isolado numa ilha, vivendo do que a natureza pode oferecer. Ir atrás de quem se é, [é] encontrar pessoas para compartilhar as nossas existências, é deixar um pouco de si e levar um pouco do outro, é dar para o outro o que ele precisa, mas sem esquecer das suas necessidades. Até que um dia, depois de andar, você encontra outra pessoa-passarinho, um ser que largou tudo o que tinha e encontrou você, porque o verdadeiro sentido de tornar-se pessoa é encontrar alguém para compartilhar aquilo que se é.

As horas.

Postado por AnaBaú às sábado, agosto 16, 2014 0 comentários
Uma trilha sonora triste está tocando ao fundo, mas ela está surda.
A música perfeita para o final de uma cena, aquela na qual a personagem principal se afoga no lago.
Ela deixou uma carta escrita para seu marido. Ela deixou várias cartas, mas ninguém as leu. E então um dia levantou-se e resolveu partir por ela mesma, sem esperar ninguém.
O coração deseja ser livre e poder voar para onde quiser.
Malas não se fazem necessárias quando se tem um coração.
O coração é o guia e ouve os sussurros do destino.
Outra se sente congelada numa história que criaram para ela.
Lhe deram um papel que ela não gostaria de representar.
Sequer lhe permitiram dar o tom de suas falas, ou o brilho de seus olhos.
Ela sente-se asfixiada olhando a imensidão de papéis que se formam a sua frente.
Todos escritos, sem um mínimo espaço em branco para ela poder colocar a sua versão.
Um dia levantou-se cedo, e partiu para a estação de trem mais próxima e desapareceu, como em suas lembranças.
Ao final da linha de trem, há alguém que chegou de algum lugar.
Ela está fechando os olhos nesse exato momento e sentindo a música que toca ao fundo.
Ela sente que esta é a música do seu destino, mas sabe que os passos serão os dela.
Pega sua mala, coloca um sorriso no rosto e anda como se fosse invisível no meio daquela multidão.
Aquele é o primeiro dia de sua vida, e ela sabe que enquanto ouvir seu coração, ela irá para o lugar certo.
 

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