14 de dez. de 2016

Corpo enclausurado

Postado por AnaBaú às quarta-feira, dezembro 14, 2016 0 comentários


Corpo enclausurado que grita
Que enrosca nas roupas
Tropeça nos sapatos
Que foge das ruas escuras

Corpo enclausurado que sente
Silenciado pelo medo
A morte dos sonhos de amor
Trancados no peito
Que trancam a porta pra sempre

Corpo enclausurado pelo peso
Qual é a medida exata da dor?
Qual é a medida capaz  de gerar libertação?
Corpo enclausurado que esconde
Que aperta
E que desperta (sozinho?)

Corpo enclausurado que apanha
Que adoece
Que cala
Que morre (sozinho?)

Sozinho.
Nenhuma sirene é acionada.
Nenhuma notícia é escrita.
Nenhuma música é tocada.
Sozinho.
Preso em si mesmo.
Esquecido num canto com uma faca no peito.
Sozinha.
Corpo enclausurado que tem nome.
Nome de mãe.
De esposa.
Companheira.
Mulher.
Sozinha.
Morre em si mesma.
Sem poder andar na rua.
Sem poder pedir ajuda.
Sozinha?

Relicário.

Postado por AnaBaú às quarta-feira, dezembro 14, 2016 0 comentários


Tenho em meu coração um relicário
Erguido com a força das ametistas e dos citrinos
Dos filtros dos sonhos, dos pêndulos e das estrelas
Regido pela eternidade e protegido pelo amor.

As vezes ajoelho e rezo
e por vezes choro
Lágrimas que correm e irrigam o coração
Umedece as sementes e elas ligeiramente brotam
E então não me resta a dúvida de que viemos do mesmo chão.

Catarse resolutiva.

Postado por AnaBaú às quarta-feira, dezembro 14, 2016 0 comentários


Tua ausência come os meus os meus pés, devora os meus calcanhares e chupa meus dedos.
A tua ausência me faz vomitar silêncios, cagar medos e ficar madrugadas acordada na ânsia de que você apareça.
A tua ausência prende meus passos, esmaga meus joelhos e engorda minhas coxas.
A tua ausência invade meu sexo, machuca os meus órgãos e me faz sangrar.
A tua ausência emudece minha boca, ensurdece meus ouvidos para tudo o que não seja você.
A tua ausência corrói minha pele como uma alergia, que coça insistentemente para lembrar que você não está.
A tua ausência me rouba o sono, o sonho, o corpo.
A tua ausência me prende no quarto, na cama, imobiliza meu coração.
A tua ausência me faz ausente, vivendo num tempo de presença que nunca existiu.
A tua ausência me enche de calos, me faz beber no gargalo, na tentativa que o álcool dissolva tudo o que vem de você.
A tua ausência me cega, me deixa sem saída, me enlouquece.
A tua ausência me apavora, e até a minha alma chora por não poder te ter.
Quisera eu poder ter sua presença, acertar os ponteiros do tempo, me pôr em seu colo, chorar minhas lágrimas, despejar meus medos. Me sentir acolhida, sentir o amor, ser a sua menina, bailarina talvez ou a sua princesa.
Mas tudo o que tenho é ausência, a tua ausência e o meu desejo, de um beijo de boa noite, de um abraço apertado, de uma gargalhada qualquer.
A tua ausência grita no vazio, e os ecos me fazem tremer.
A tua ausência me irrita, me estressa, me revolta, me faz querer ser como você.
A tua ausência me deixa marcada profundamente, na barba, no pelo, no sexo, no desejo – de ser como você, de ter você, de amar você e ser amada também, e ser aceita também, e ser desejada também, e de ser vista.
Papai, você consegue me ver através do espelho? Você consegue sentir o quanto eu preciso de você? Você percebe o quanto eu te amo e o quanto eu te quero perto? Você nunca pensou nisso?
Na tua ausência eu me sinto frágil, indefesa, como se não pudesse crescer.
Na tua ausência eu não consigo fingir que não estou sozinha.
Na tua ausência, me falta um pedaço, surge um buraco e eu não sei como preencher!
Na tua ausência eu tive que aprender a sobreviver.
Na tua ausência, eu pude viver sem você, mas a tua ausência segue como um fantasma que ocupa a cadeira vazia na sala de estar.
A tua ausência ocupa o espaço do abraço que não vem, das palavras que não vem, do beijo que não vem, do orgulho que não vem, do amor que não vem, do pai que não existe.
A tua ausência me diz que o seu espaço rouba  o meu espaço de existência. Me rouba o sonho, a vida que eu finalmente poderia viver sem você.
A tua ausência, um dia talvez seja a minha ausência, porque quando eu tiver ido embora, serão os meus gritos que você vai ouvir pelas paredes.

 

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