Tua ausência come os meus os meus pés, devora os meus
calcanhares e chupa meus dedos.
A tua ausência me faz vomitar silêncios, cagar medos e ficar
madrugadas acordada na ânsia de que você apareça.
A tua ausência prende meus passos, esmaga meus joelhos e
engorda minhas coxas.
A tua ausência invade meu sexo, machuca os meus órgãos e me
faz sangrar.
A tua ausência emudece minha boca, ensurdece meus ouvidos
para tudo o que não seja você.
A tua ausência corrói minha pele como uma alergia, que coça
insistentemente para lembrar que você não está.
A tua ausência me rouba o sono, o sonho, o corpo.
A tua ausência me prende no quarto, na cama, imobiliza meu
coração.
A tua ausência me faz ausente, vivendo num tempo de presença
que nunca existiu.
A tua ausência me enche de calos, me faz beber no gargalo,
na tentativa que o álcool dissolva tudo o que vem de você.
A tua ausência me cega, me deixa sem saída, me enlouquece.
A tua ausência me apavora, e até a minha alma chora por não
poder te ter.
Quisera eu poder ter sua presença, acertar os ponteiros do
tempo, me pôr em seu colo, chorar minhas lágrimas, despejar meus medos. Me
sentir acolhida, sentir o amor, ser a sua menina, bailarina talvez ou a sua
princesa.
Mas tudo o que tenho é ausência, a tua ausência e o meu
desejo, de um beijo de boa noite, de um abraço apertado, de uma gargalhada
qualquer.
A tua ausência grita no vazio, e os ecos me fazem tremer.
A tua ausência me irrita, me estressa, me revolta, me faz
querer ser como você.
A tua ausência me deixa marcada profundamente, na barba, no
pelo, no sexo, no desejo – de ser como você, de ter você, de amar você e ser
amada também, e ser aceita também, e ser desejada também, e de ser vista.
Papai, você consegue me ver através do espelho? Você
consegue sentir o quanto eu preciso de você? Você percebe o quanto eu te amo e
o quanto eu te quero perto? Você nunca pensou nisso?
Na tua ausência eu me sinto frágil, indefesa, como se não
pudesse crescer.
Na tua ausência eu não consigo fingir que não estou sozinha.
Na tua ausência, me falta um pedaço, surge um buraco e eu
não sei como preencher!
Na tua ausência eu tive que aprender a sobreviver.
Na tua ausência, eu pude viver sem você, mas a tua ausência
segue como um fantasma que ocupa a cadeira vazia na sala de estar.
A tua ausência ocupa o espaço do abraço que não vem, das
palavras que não vem, do beijo que não vem, do orgulho que não vem, do amor que
não vem, do pai que não existe.
A tua ausência me diz que o seu espaço rouba o meu espaço de existência. Me rouba o sonho,
a vida que eu finalmente poderia viver sem você.
A tua ausência, um dia talvez seja a minha ausência, porque
quando eu tiver ido embora, serão os meus gritos que você vai ouvir pelas
paredes.